Quando o 25 de Abril aconteceu, vivia em Angola (Luanda) e foi com muita alegria que o comemorei.
Apesar de em Angola ter uma vida diferente da que tinha no Continente, com mais liberdade de expressão, social, pois os meninos e as meninas na escola tinham aulas e recreios em conjunto, sem falta de trabalho, enfim uma vida quase sem preconceitos, quase perfeita. Fiquei feliz pelos portugueses que viviam no Continente.
Passado um ano, tudo se alterou, pois os procedimentos de justos passaram a ser injustos e fui convidada (obrigada) a regressar ao Continente que era a minha terra. Tiraram-me um doce ainda a meio. Foi assim que me senti naquela altura.
Ao chegar cá, sofri muito, com o diferente clima, sem dinheiro, sem um tecto, sem trabalho e com dois filhos pequenos e principalmente com os preconceitos que existiam.
Na minha terra, nunca arranjei trabalho porque era uma libertina, uma mãe moderna, não era submissa ao marido, pois o melhor era para os meus filhos em vez de ser para o pai, e não era assim que as mães da altura procediam.
Mudei-me para Lisboa, à procura do bendito trabalho, para que os meus filhos deixassem de passar necessidades e eu deixasse de dormir no chão... ter uma casa minha.
Nessa altura fiz uma promessa a mim mesmo, trabalharia noite e dia, mas nunca mais os meus filhos iriam passar fome.
Muitas vezes ao passar no Rossio, o meu coração sofria, ao ver pessoas amigas de Luanda, pessoas que tinham uma vida desafogada, pessoas boas que ajudavam os seus empregados, distribuindo no final do ano os lucros da sua empresa pelos seus colaboradores, a passarem dificuldades, alguns fome. Essas pessoas não tinham culpa do que aconteceu. A única culpa que tinham era amar Angola e terem investido lá tudo o que ganhavam.
Passados 38 anos, continuo a ver os meus filhos com um futuro incerto, o mais novo emigrou, o mais velho resolveu sair de Lisboa, indo para uma cidade mais pequena, para criar o filho longe da insegurança que se vive em Lisboa. O que antes era bom numa cidade grande hoje é péssimo. Amigos a passarem fome, idosos que não conseguem comprar medicamentos, crianças com fome, pais desesperados por não conseguirem pagar os estudos dos seus filhos, famílias obrigadas a entregar à Banca as suas casas. Tantos desempregados, meu Deus.
Não gosto mesmo nada de falar sobre o 25 de Abril, Angola, pois as saudades são muitas, mesmo na minha terra eu sou uma inadaptada, mas hoje teve que ser... talvez devido ao dia chuvoso que está, que em mim provoca nostalgia e um bocadinho de raiva e principalmente, por ver irem por cano abaixo tantos sacrifícios, tanta luta, tanta dor.. e o país estar neste sufoco.
Lembrando o nosso poeta Ary dos Santos "E o grito que foi ouvido tantas vezes repetido dizia que o povo jamais será vencido" . Neste momento está a ser vencido.
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