Como as aparencias enganam

Nesta altura do ano gosto de reflectir, de fazer um balanço das acções boas e menos boas que fui praticando ao longo do ano. Se me coloquei no lugar do outro em vez de julgá-lo, se ajudei quem precisou, se aguardei distância daquilo que me deixa em baixo, se cultivei mágoas, etc.

Como disse Confúcio: "Se queres prever o futuro, estuda o passado".

Nesta reflexão tenho em mente o seguinte episódio.

Há uns anos atrás, quando o meu neto era pequeno, adorávamos aos domingos à tardinha ir passear de comboio para Lisboa. Infelizmente, hoje já não o faço, porque não sinto segurança.

Numa dessas viagens, ao sentarmos-nos vi que no banco à nossa frente estava sentada uma jovem, muito simples e cheia de sono.

Pensei, deve estar cansada e aproveitou o tempo da viagem para dormir.

Na estação a seguir entraram duas senhoras muito elegantes que regressavam  de algum jogo de canastra. Olharam para ela e uma das senhoras disse:

- Deve ser uma dessas drogadas que andam para aí sozinhas, abandonadas!

A outra acrescentou:

- Ou talvez seja uma dessas jovens que vêm do Leste à procura de emprego. Podiam ficar na sua terra, em vez de virem tirar o trabalho aos nossos.

As senhoras mostravam um ar desconfortável com a companhia.

Ao chegarmos ao Rossio (Lisboa), a jovem acordou.

Olhou em redor. Viu o olhar de rejeição das duas  elegantes senhoras e disse:

- Peço desculpa se vos incomodei. Estive todo o fim de semana com idosos e crianças deficientes que me deixaram exausta. Gosto muito de ser voluntária e de dar amor aos mais necessitados.

As ditas senhoras se tivessem ali um buraco tinham-se enfiado lá.

Como as aparências enganam, elas escondem a realidade. Nem sempre aquelas que vestem boas roupas são pessoas de qualidade moral.